quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Sociedade, subsídio e BNDES

Enfim pinta um debate sobre os subsídios do Tesouro ao BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). Mas é pouco: a sociedade precisa saber mais sobre o conjunto do subsídio e discutir como o banco pode melhor atender ao interesse público.

O BNDES se tornou um dos quatro maiores bancos de desenvolvimento do mundo e triplicou seu desembolso nos últimos três anos. É um fato ainda pouco compreendido, no país e no exterior.

Nos EUA, me mostraram como o BNDES é hoje o principal acionista de toda a indústria de proteína animal daquele país.

Já na região andina e na África, substitui os bancos multilaterais. O subsídio do Tesouro -que o IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) estima em R$ 21 bilhões/ ano- turbina o processo, mas é adicional àqueles oriundos do Fundo de Amparo ao Trabalhador e do compulsório do Banco Central, que todos pagamos por meio de juros.

Não é para ter medo de subsídio, se transparente e bem direcionado. E o problema não reside só no banco: Congresso, governos locais, sociedade civil, Tribunais de Contas, academia e imprensa ainda pouco contribuíram para definir o mandato da sociedade ao banco; aí surgem lógicas e conveniências políticas que fogem à compreensão.

A agência de classificação de riscos Fitch alerta para a crescente concentração da carteira do banco nos dez principais clientes, que já atingiu 36,2%.

Tal concentração reflete uma política, a de promover campeões brasileiros nos mercados globais. Merece debate, bem como a de se envolver em empresas concorrentes, com implícito conflito de interesse. Ou a de receber doações da Noruega para reduzir emissões de carbono, sem avaliar a pegada de carbono de seus próprios investimentos.

Tanto o BNDES quanto os que às vezes o criticam se limitam a focar prós e contras de projetos polêmicos, deixando de analisar o custo de oportunidade gerado pela priorização de um setor em detrimento de outro, ou de um segmento dentro do mesmo setor.

No elétrico, jorra R$ 46 bilhões em três megausinas de alto risco na Amazônia, preteridas por bancos privados, e, no nuclear, sem comparar efetividade e impacto de um investimento de igual vulto na eficiência energética. Nem considera geração da biomassa, mesmo envolvido em peso na cadeia da cana.

O banco segue investindo alto nos frigoríficos, com aquisições no exterior que estimulam a concorrência com nossa pecuária, ainda de baixa produtividade média. Enquanto isso, aqui ninguém investe na necessária transição tecnológica e na superação dos grandes passivos socioambientais da produção primária, condições essenciais para ela se integrar de forma sustentável nas cadeias que deveriam interessar ao banco, grande acionista do segmento industrial.

Cadeias com alto poder indutor, como saneamento, são estratégicas. Longe de sonharmos com Copa e Olimpíada sem esgoto, mesmo a meta de universalizar serviços até 2024 implica investir, por ano, pelo menos 8% do que o BNDES desembolsou em 2010, ou metade do subsídio do Tesouro. Pode-se promover um pacto nacional para tanto? Não é para substituir a Caixa, e sim para somar: é preciso investir em tecnologia para maior produtividade dos recursos aplicados.

A sociedade diz ao banco o que não fazer; já lobistas internos ou externos ao governo mostram o que fazer. O BNDES precisa de orientação política para atender a interesses difusos, demanda estruturada para priorizar cadeias críticas para o desenvolvimento, soluções para segmentos de inovação competitiva, cobrança para transparência e avaliações estratégicas, inclusive nos critérios socioambientais.

Subsídios maciços e protagonismo internacional são ótimas justificativas e oportunidades para tanto.

Fonte: Envolverde

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