segunda-feira, 3 de maio de 2010

Espécies ditas extintas reaparecem na vida real

Casos recentes levaram a UICN a endurecer os critérios de risco. Veja a lista de 10 espécies seriamente ameaçadas.

O ano de 2010 ainda nem chegou à metade e já está trouxe novidades, do ponto de vista da conservação ambiental. Desde janeiro pelo menos três espécies consideradas extintas voltaram a aparecer no mundo, uma delas inclusive no Brasil.

Sem nenhum registro há mais de 200 anos, a planta Microlicia myrtoidea, um arbusto florido da família do manacá da serra, foi encontrada durante as obras de construção do Rodoanel, em São Paulo.Também desaparecido há mais de um século, o minúsculo inseto voador Hydroptila tigurina – com menos de 3 milímetros de comprimento – foi localizado no Reino Unido. Na Austrália, o “ressurgimento” da rã Litoria castanea ganhou ares de festa patriótica, com direito a anúncio feito pelo ministro do Meio Ambiente e Mudança Climática, Frank Sartor.
Mas nem tudo é festa. A mais nova atualização da chamada Lista Vermelha – mais respeitado documento sobre preservação de espécies – classifica como “provavelmente extintas” quatro variedades esturjão, peixe que fornece as ovas do caviar. Segundo a ONU, cerca de 150 espécies são extintas todos os dias no mundo, a maioria causada pela intervenção do homem e os efeitos do aquecimento global, que interfere no equilíbrio de alguns ecossistemas. Para atrair as atenções mundiais para a causa, a ONU declarou 2010 como Ano Internacional da Biodiversidade e realizará, em setembro, a Convenção sobre a Biodiversidade em Nova York, para alertar para a sinistra previsão de que, até 2030, 75% de todas as espécies de animais e vegetais podem estar ameaçadas de extinção. Hoje, elas são 36%. Répteis estão entre os mais vulneráveis. De todas as espécies conhecidas, 28% estão ameaçadas. Entre as plantas, o número chega a 70%. Nos mamíferos conhecidos, dois em cada 10 estão sob risco de extinção.

O ressurgimento de uma rã considerada extinta ganhou festa na Austrália.



Quando se decreta uma extinção

Apesar das comemorações por um lado e preocupações por outro, as descobertas reacenderam uma questão delicada para os ambientalistas: qual é, afinal, o critério que determina a extinção definitiva de uma espécie?

"As listas de espécies ameaçadas são importantes, mas estão longe de serem absolutas e indiscutíveis", considera o especialista em conservação Robert Sweer, da Universidade de Cornell, nos Estados Unidos, para quem é preciso maior atenção da comunidade internacional quanto aos critérios usados.

Decretar o fim de uma espécie é uma tarefa trabalhosa, demorada e muito cara. Pelos últimos números divulgados da Lista Vermelha, compilada pela União Internacional para a Conservação da Natureza e dos Recursos Naturais (IUCN), já são 875 espécies completamente extintas ou extintas na natureza e outras 17.291 criticamente ameaçadas de desaparecer totalmente. Segundo a Convenção sobre a Diversidade Biológica da ONU, a perda de espécies é cem vezes maior que a velocidade da extinção natural.

Embora os números sejam aparentemente precisos, não é fácil monitorar populações inteiras de animais ou vasculhar áreas extensas de florestas atrás de uma ou outra variedade de planta. Por isso, normalmente é preciso esperar muitos anos, até décadas, sem que haja qualquer registro do organismo. Em alguns casos, porém, cientistas organizam expedições ao habitat das espécies suspeitas de estarem desaparecendo.

Como ainda não se tem um levantamento preciso de todas as espécies de plantas, insetos e animais do planeta – estima-se que os registros não cheguem a 50% da biodiversidade-, o trabalho fica ainda mais difícil. Em muitos casos, a possibilidade de extinção é feita por amostragem.

Para saber chegar à quantidade de espécies destruídas, por exemplo, pelo desmatamento de grandes áreas de floresta, os cientistas estimam a quantidade de vida presente na mata e depois calculam o quanto dela foi perdido com o desaparecimento desse ambiente. Em muitos casos, sabe-se que há espécies codependentes, o que provoca um efeito cascata na destruição.

Mas, para além das questões ecológicas, o desaparecimento das espécies tem sérias implicações financeiras e políticas. Declarar que um organismo está oficialmente extinto significa acabar com os recursos para a preservação de seu habitat e mesmo para incursões em florestas e rios à sua procura. Os fundos de financiamento ambiental movimentam bilhões de dólares todo ano, beneficiando organizações não governamentais, universidades e até políticas públicas. Por isso, apontam alguns críticos, muitos conservacionistas relutam em oficializar a extinção.

O tema também envolve interesses nacionais. Em alguns casos, a extinção também pode arranhar a reputação de um país e despertar pressão da comunidade internacional. O exemplo mais recente é do boto Baiji, natural do rio Yangtzé, na China. A construção da usina hidrelétrica de Três Gargantas alterou a vazão e o curso das águas, prejudicando a reprodução e a locomoção da espécie. Em 1986, havia mais de 300 indivíduos no rio. Em uma expedição em 2006, com a usina já em funcionamento, não foi encontrado nenhum. Ainda assim, o governo chinês não admite publicamente o desaparecimento do boto e alguns especialistas envolvidos em projetos de conservação no rio também não.

Atenção internacional
O documento que guia as políticas de conservação em todo mundo é a Lista Vermelha da IUCN. Ela traz um inventário de várias espécies e subespécies de plantas, animais, fungos e seres unicelulares. As informações são coletadas por diversos institutos e pesquisadores. Embora seus criadores procurem não deixar as espécies por mais de cinco anos sem reavaliação, há mais de 7 mil delas sem novas informações desde 1996.

Recentemente, o “reaparecimento” de espécies classificadas como extintas pela Lista Vermelha levou a IUCN a rever seus critérios. A organização endureceu os critérios e agora pede o parecer de vários especialistas para bater o martelo quanto ao desaparecimento de uma espécie em definitivo.

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